terça-feira, 27 de novembro de 2007

Meia vida, vida e meia

Não quero viver as coisas pela metade
Não suporto estar aqui podendo estar lá
E sabendo que posso

“Se é pra sorrir, que seja com todos os dentes”
Se é pra amar, que seja de corpo e alma
Se é pra brincar, que seja sem preocupação

Mas minha aura é preocupada por natureza
Quando acho que ela está calma, susto
Acordo de madrugada com coração acelerado

Será que faço o que quero?
Será que quero o que faço?
Será que quero tudo?
Só sei que não quero metade.

sábado, 24 de novembro de 2007

A-tchim de cantigas de roda

Era uma vez um dia desinteressado
e eu, desinteressante,
espirrei umas cantigas de roda
do-baú
mais umas canções e jingles
quaisquer
e ficou assim:

blum
bum
tchibum
tim
tim
a
ah
aah
tchim!
Atchum!
bum
bum
bumbum
bom
bom
bombom
bem
bem
meu bem
blém
belém
belém-belém, nunca-mais eu tô de-bem, até o ano-que-vem!

nem-vem-que-não-tem
vamos-todos-cirandar
sem dar meia-volta
volta-e-meia vamos dar

se essa rua fosse minha
caranguejo peixe era
o anel que tu me deste
era fogo e me queimou

eu mandava ladrilhar
a rua dos bobos número zero
choque-choque por aí
do berro que o gato deu
e quebrou as pedrinhas de brilhantes

atirei um pau no gato
mas não era vidro e não quebrou
o amor que tu me tinhas
era uma casa muito engraçada
mas era feita sem muito esmero

para o meu amor passar
cirandando cirandinha
abacaxi e piuí
do sambalelê
da cabeça remendada

eu vou, eu vou, pra casa agora eu vou
que estou fervendo
melhor nem vir quente
quem bate é o frio
mas nem deixo você entrar
lãs e cobertores já comprei

um é pouco, três é demais
já dizia o caboclo
anda pra frente que atrás vem gente
mas a casa não tinha chão
nem parede com rede
só rede sem parede
e agora, josé?

o sapo lava o pé!
lá na lagoa não tem sabonete
mas ele lava porque quer
e não tem chulé
blé!

quem conta um conto
tira uns pontos
e agora é com vocês
se quiser, que conte outra vez!

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Olha aí

Olha só quem apareceu
saiu debaixo da capa preta
falou tudo o que pensava que era mudo
mudou tudo o que achava que era fixo
Correu, andou, olha só como ri
maria-sem-vergonha é aquela florzinha
aparece em todo canto, por isso a difamam
mas tudo o que ela faz é alegrar a paisagem
Esquilos andam todos desengonçados
parece que ainda não aprenderam nada
quebram as nozes timidamente
mas vão pra todo lugar, olha lá
Pra que se esforçar pra chamar atenção?
nada brilha mais do que sorriso
quando o medo vai embora, a capa voa
e diz: "olha, olha lá o que eu cobria"

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Sublime

Não pense que é todo dia que escrevo poesia
Não, não é assim fácil que nem falar
(se bem que discordo que falar é sempre fácil)
Mas poemas, ah, você pensa que eles saem assim, do ar?
Não, que nada, poema é algo sublime
- De sublimar
Sempre pensei que sublimar carrega um mistério
(uma coisa está sólida e, de repente, puf, some dos olhos

e não dá pra ver o processo, simplesmente acontece
mas você não vê acontecendo, só o acontecido - que ainda é invisível)
Afinal, nunca vi algo sublimar

Mas poesia, ah, poesia é algo sublime
E que, portanto, sabe sublimar
E faz tanto sentido quanto emoções em versos,
quanto rimas sem pé nem cabeça
e quanto cabeças na lua
Ah, sublime! Poesia é assim
Nunca vi algo poesiar, só que poema não aparece de repente, já acontecido
Poesia acontece, poesiando devagar
Mas ela só te toca de repente, num total, sublime.;'

Sem título




Queria ser menos preocupada - com tudo


Queria sair sem mala - até podia avisar, mas sem mala


Queria ser menos meticulosa, esses pensamentos detalhistas ficam voando na frente da minha vista e saturando minha cabeça


Queria ficar nem aí pra estar nem aí


Queria escrever um poema sem começar cada verso com a mesma palavra, ou até escrever sem verso


Queria escrever uma linha de letra de mão corrida em pena no ar, fazendo uma ponte até o mar, é, só pra andar por cima dela, olhar a serra, sentir a vertigem e pisar forte rindo porque passou. Não, nem ia me molhar, não queria me afogar, não não já é noite e o mar é forte, só se fosse a chuva, ela, pra variar. Ah, e o vento, que brinca de brisa, ele parece se divertir tanto que dá vontade de brincar junto - minha saia ajuda, ela gira e gira suave, enquanto eu danço descoordenada e meu cabelo faz cócegas nos olhos, fechados, abertos, quem liga.. eu não, e aí, não penso no aí, nem no aqui, to nem, nem aí, nem aqui, nem lá, e aí, acho que consegui o que queria - e foi tudo dum papel em branco com pensações voantes sem ponto final

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Chovida

CHOVE, aquela chuva calma, espevitada de verão, como a "aurora da vida". Talvez a chuva seja a melhor tradução da vida, metáfora de vários tipos de vivências. A chuva-temporal-de-raios-e-trovões, é o medo do sem controle, das situações obscuras em que nos metemos, é o não achar o caminho de volta pra casa. A chuva-de-pedras-de-gelo é o toc-toc de uma realidade dura, que chega de súbito, mas de leve; ou o emergir de uma idéia latente, única, surpreendente. A chuva calminha e grossa, no calor, é aconchego, é a fala do cotidiano bem perto do ouvido, é simplicidade fina, difícil até de acreditar, porque tentamos rebuscar; é cada gota sentida pra viver plenamente. Chuva fininha com ventania de inverno é a rigidez da realidade - o fôlego da jornada vem ao encara-la de frente; é contratempo e impulso ao mesmo tempo. E aí chega a chuva-de-verão, torrente de supetão; é intensidade pura, é insensatez, é a virada radical que cada situação precisa, é força, vigor, é entrega. É chuva, é vida.

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Te digo a chover

Se você disser que eu vivo na chuva
Direi que maior verdade não há
Se aqui, agora, vivo a torrente,
É que vivo sempre e não quero parar

Se de pé em pé d’água nasce um caminho
Andarilho, corro e pulo, sem dó
Dó é trovão duro em terra seca
Piedade é água corrente no solo

O chão, molhado, é bem mais macio
É canto e poesia de escorregar
Nas vielas da vida desconhecidas
Que tanto levam a nos encontrar

Não entendo como que as nuvens fazem
Pra todo tipo de chuva chover
Mas sei que ajo como elas agem
Sem perceber, ao cair a viver