segunda-feira, 29 de julho de 2013

presente

                                    ao meu avô

busco um cheiro que já não existe
sinto saudades de algo que nunca foi
pairo numa melancolia confusa
que farfalha sorrisos internos
imprevisíveis

de súbito, a vista da janela me desanuvia a mente
os pisca-piscas mal colocados
a televisão ligada na penumbra da sala
aconchego de porta aberta
me comovem

e o que me sobra é a presença do seu conforto
deslocada nesta cena
e nos meus olhos

quinta-feira, 18 de julho de 2013

a gente escreve

mesmo sabendo que jamais será possível passar em letras um décimo do que é viver, a gente escreve. pra registar momentos, pensamentos, ideias ou emoções. pra desacorçoar a alma, acalmar a mente e o coração. a gente escreve, porque coçam os dedos, porque palpita o corpo.

a gente escreve pra avisar aos desavisados que viver é perigoso, mas absolutamente imperdível e, mais, necessário, além de inevitável e inevitavelmente melhor que apenas olhar a vida passar – mesmo sabendo que não adianta o aviso.

a gente escreve, porque tem medo da morte, pra engrandecer a existência. escreve pra doer e pra sarar a dor, pro deleite e o desgosto. a gente escreve, porque tem fome de comer papel e vomita textos inteiros. escreve pra burlar o destino e reinventar passados. a gente escreve pra se isolar do mundo e se sentir menos sozinho. escreve pra esconder e jogar ao vento. pra dar vez à voz calada, esclarecer a voz confusa.

a gente escreve, porque lê, ouve e grita. pra crescer, entender, lutar, dançar, viajar e todos os outros verbos. a gente escreve pelos substantivos, adjetivos, advérbios, sujeitos e predicados. pra subverter a própria escrita. a gente escreve, porque tem o que dizer com silêncios. porque é inevitável e necessário. a gente escreve.