Meus olhos não uso só pra ver,
Queriam ser lente fotográfica
Os ouvidos, amplificadores
A cabeça, papel e tinta
A boca, autofalante
Os sentidos, gente inteira
Cada um, todos juntos
O corpo, no mundo
Os gestos, transformações
no corpo do mundo
Os espíritos sem véus
Tentam velar por outros
Só de não ficarem parados
Já é algo mais que nada
É mais. É muito
É movimento:
A diferença que faz falta,
Que esvazia os vazios,
Que faz
quarta-feira, 30 de julho de 2008
sexta-feira, 11 de julho de 2008
De (s) fazer malas
Odeio. Elas embaçam toda aquela empolgação com a viagem! Porque lembram das preocupações. “Tenho que levar isso, não posso levar aquilo porque posso perder, não posso esquecer daquilo-outro – vai que acontece aquilo lá, né?”.
E, mesmo assim, não consigo ir sem mala. Já disse, em outro post, como queria fazê-lo; desde então, não o cumpri, foi como uma promessa de final de ano (promessas deveriam ser de começo de ano!).
A verdade é que a mala representa um pacote de segurança (assim já mostrava a boa-e-velha bolsa do Gato Félix). Sobra-me falta de medo de sair poraí, mas a bagagem me lembra que ainda me sinto mais indefesa do que muitos espinhos do mundo. Claro que o incoerente seria se não me sentisse assim.
O inconveniente é que não costumo seguir o tão popular “menos é mais” quanto a malas. Não me importo de carregar mais peso se existe a (remota) possibilidade de realmente precisar de algo a mais. Bem, talvez isso até seja algum tipo de virtude.
O engraçado é que sigo o mesmo “lema” (‘mais é mais?’) em relação às palavras. Exato: às vezes, falo demais (sobre eu mesma, já que sou eu que decido o que é meu ‘segredo’; as palavras dos outros sobre os outros, procuro guardar até segunda ordem).
Mas quer saber de uma coisa? Mesmo sofrendo com conseqüências de algumas falas a mais, não costumo me arrepender delas. Palavras são segurança: quando ditas, provocam efeitos bons ou ruins; já guardadas, não provocam nada, não abrem possibilidades.
Acho que é por isso mesmo que os escritores tanto escrevem. Dá pra notar certa insegurança diante do mundo em muitos deles, que recorrem às letras pra falar sobre ela. É por isso também que, quando não tenho o que dizer, sinto vontade de me afogar em palavras. Prefiro tentar nadar a ficar apenas observando o rio correr.
Mas não sinto a menor vontade de me afogar em malas – então, vim me refugiar nas palavras aqui. E, quem sabe, esse amontoado de letras preste a alguém mais, já que palavras alheias também podem ser abrigo.
E, mesmo assim, não consigo ir sem mala. Já disse, em outro post, como queria fazê-lo; desde então, não o cumpri, foi como uma promessa de final de ano (promessas deveriam ser de começo de ano!).
A verdade é que a mala representa um pacote de segurança (assim já mostrava a boa-e-velha bolsa do Gato Félix). Sobra-me falta de medo de sair poraí, mas a bagagem me lembra que ainda me sinto mais indefesa do que muitos espinhos do mundo. Claro que o incoerente seria se não me sentisse assim.
O inconveniente é que não costumo seguir o tão popular “menos é mais” quanto a malas. Não me importo de carregar mais peso se existe a (remota) possibilidade de realmente precisar de algo a mais. Bem, talvez isso até seja algum tipo de virtude.
O engraçado é que sigo o mesmo “lema” (‘mais é mais?’) em relação às palavras. Exato: às vezes, falo demais (sobre eu mesma, já que sou eu que decido o que é meu ‘segredo’; as palavras dos outros sobre os outros, procuro guardar até segunda ordem).
Mas quer saber de uma coisa? Mesmo sofrendo com conseqüências de algumas falas a mais, não costumo me arrepender delas. Palavras são segurança: quando ditas, provocam efeitos bons ou ruins; já guardadas, não provocam nada, não abrem possibilidades.
Acho que é por isso mesmo que os escritores tanto escrevem. Dá pra notar certa insegurança diante do mundo em muitos deles, que recorrem às letras pra falar sobre ela. É por isso também que, quando não tenho o que dizer, sinto vontade de me afogar em palavras. Prefiro tentar nadar a ficar apenas observando o rio correr.
Mas não sinto a menor vontade de me afogar em malas – então, vim me refugiar nas palavras aqui. E, quem sabe, esse amontoado de letras preste a alguém mais, já que palavras alheias também podem ser abrigo.
quarta-feira, 9 de julho de 2008
Do divã – Caso 1
Relato
Mirabella não sabe ser normal. No sentido de se sentir, simplesmente, normal, entende? Não consegue ficar nem-feliz-nem-triste, só “normal”. Suas emoções são como um pêndulo: hora no alto, hora embaixo, nunca neutras. Subir numa pedrinha no meio da rua pode fazer como que ela se sinta no topo do Monte Everest; tropeçar num buraco, pode deixá-la como na areia movediça. Quando se estabiliza, ou é no alto, ou embaixo. Assim, seu “estabilizada” não quer dizer “estável”, razoável, médio ou normal. Descobriu que obedece à lei da gravidade, mas em dois sentidos: tudo o que sobe, desce; tudo o que desce, sobe.
Em uma semana especialmente cheia de pedras e buracos, nauseou-se com os sobressaltos e decidiu mudar. Gastou dias inteiros estudando cada artigo daquela lei pra achar uma exceção. Subiu e desceu as escadarias de muitas bibliotecas. Até que jogou os papéis da pesquisa do último andar de uma delas. “Tudo o que sobe, desce”. E os papéis foram pegos pelo vento, subiram, ainda mais, pelo céu da cidade. Alguns foram encontrados na grama do parque, outros devem ter se enroscado em algumas nuvens. Talvez caiam com a próxima chuva e alguém possa retomar a pesquisa. Mirabella desistiu de pesquisar, estava ficando enjoada com aquele “marasmo”, foi andar de montanha-russa.
Diagnóstico
Não foram encontrados indícios de paranormalidade ou normalidade crônica, apesar das tendências neuróticas. A paciente é perfeitamente anormal.
Profilaxia
É necessário cuidado caso o parque de diversões feche. Evite os feriados vazios e as comidas sem sal.
Tratamento
Duas doses de pimenta ao dia são indicadas para manter as taxas de sanidade.
Mirabella não sabe ser normal. No sentido de se sentir, simplesmente, normal, entende? Não consegue ficar nem-feliz-nem-triste, só “normal”. Suas emoções são como um pêndulo: hora no alto, hora embaixo, nunca neutras. Subir numa pedrinha no meio da rua pode fazer como que ela se sinta no topo do Monte Everest; tropeçar num buraco, pode deixá-la como na areia movediça. Quando se estabiliza, ou é no alto, ou embaixo. Assim, seu “estabilizada” não quer dizer “estável”, razoável, médio ou normal. Descobriu que obedece à lei da gravidade, mas em dois sentidos: tudo o que sobe, desce; tudo o que desce, sobe.
Em uma semana especialmente cheia de pedras e buracos, nauseou-se com os sobressaltos e decidiu mudar. Gastou dias inteiros estudando cada artigo daquela lei pra achar uma exceção. Subiu e desceu as escadarias de muitas bibliotecas. Até que jogou os papéis da pesquisa do último andar de uma delas. “Tudo o que sobe, desce”. E os papéis foram pegos pelo vento, subiram, ainda mais, pelo céu da cidade. Alguns foram encontrados na grama do parque, outros devem ter se enroscado em algumas nuvens. Talvez caiam com a próxima chuva e alguém possa retomar a pesquisa. Mirabella desistiu de pesquisar, estava ficando enjoada com aquele “marasmo”, foi andar de montanha-russa.
Diagnóstico
Não foram encontrados indícios de paranormalidade ou normalidade crônica, apesar das tendências neuróticas. A paciente é perfeitamente anormal.
Profilaxia
É necessário cuidado caso o parque de diversões feche. Evite os feriados vazios e as comidas sem sal.
Tratamento
Duas doses de pimenta ao dia são indicadas para manter as taxas de sanidade.
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